Aves selvagens encontram um lugar que também é seu na urbanidade da cidade
04/02/2025
Com uma medida de asa de 51 milímetros, um bico pouco maior que os 14 mm e 9,1 gramas de peso, a juvenil carriça apanhada a sobrevoar a Quinta de Salgueiros, em Campanhã, já tem “cartão de cidadão” do Porto. É uma das quase seis dezenas de espécies de aves selvagens que têm escolhido a cidade como casa, mesmo que de passagem. Com redes, perícia e conhecimento científico, as sessões de anilhagem que o Município está a promover têm comprovado como mesmo a urbanidade portuense tem condições ótimas para acolher uma biodiversidade, para muitos, ainda desconhecida.
Para Rui Brito, “a realidade nos parques da cidade tem sido uma surpresa muito interessante”. O responsável do Grupo de Anilhagem e Ornitologia do Porto (GAOP), acompanhado de uma equipa de biólogos certificada pelo Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas, tem percorrido parques e jardins a capturar, colocar uma pequena anilha e conhecer as aves que sobrevoam a cidade nos seus trajetos migratórios.
O objetivo é “estudar os seus ciclos de vida e, depois, perceber a importância de determinados espaços para as aves e, também, para a Humanidade”. Também para o vice-presidente, este é um “processo muito importante porque se trata de conhecer o que são os também habitantes desta cidade, que, muitas vezes, não vemos”.
“Conhecer o ecossistema permite-nos, depois, tomar decisões e melhorar os espaços verdes de modo a que eles tenham aqui a capacidade de viver”, considera Filipe Araújo, referindo a “biodiversidade imensa da cidade, não só a nível de aves, mas também de anfíbios e mesmo de polinizadores”.
O também responsável pelo Ambiente e Transição Climática assume que “compete a todos nós, pessoas e Município, preservar esses ecossistemas”. Filipe Araújo considera que “temos de conseguir disponibilizar novos parques, novos jardins, mais árvores, mais corredores verdes para que estas espécies possam habitar a nossa cidade com condições”.
No mundo das aves selvagens, a surpresa tem sido uma constante. “No Parque das Virtudes, que é um espaço muito urbano e muito central, tivemos quase 40 aves capturadas, de 15 espécies diferentes”, conta Rui Brito, admitindo que “no centro de uma cidade, ninguém estava à espera”.
Além destes espaços, a anilhagem científica, iniciada em maio do ano passado, e que tem chamado dezenas de curiosos, já passou pelos Jardins do Palácio de Cristal, pela Horta da Oliveira, pela Quinta do Covelo, assim como pelo Parque Oriental, onde o GAOP tem uma estação fixa com uma sessão todos os meses.
Foi, aliás, aqui que a equipa conseguiu apanhar uma águia calçada, a maior surpresa, deixando a expetativa da sua reprodução na cidade. Até hoje, já foram anilhados mais de 180 indivíduos, de 28 espécies diferentes, que voam nos céus do Porto.
Havendo aves mais difíceis de apanhar através das redes, as sessões já permitiram, pelo menos, avistar ou ouvir o chilrear de outras três dezenas de espécies, entre elas uma trepadeira comum, confirma Rui Brito. “Sabíamos que existia, mas não é fácil de ver”, o que aumentará a população portuense em cerca de duas mil aves selvagens, explica.
O responsável do GAOP sublinha a cada vez maior escassez de lugares verdes em meio urbano e como é “importantíssimo para estas espécies terem sucesso nas suas migrações, para se poderem alimentar e descansar, haver espaços desta relevância”. Aquilo a que o especialista gosta de comparar com “estações de serviço” numa longa estrada para as aves.
É, também, por isso que o Município se encontra a “desenvolver um projeto europeu, que pretende voltar a disponibilizar a Quinta de Salgueiros à população”, confirma o vice-presidente, sublinhando como o espaço “será um grande ‘biolab’, um laboratório vivo para trabalhar as espécies e os ambientes urbanos relativamente às alterações climáticas”.
Filipe Araújo considera aquele lugar em Campanhã “muito especial na cidade do Porto, com história e com património que o Município está empenhado em preservar”.
A partir de agora, a Quinta de Salgueiros, que, confirma Rui Brito, “tem um potencial enorme, habitats bastante diferenciados e interessantíssimos para várias espécies de aves”, vai ser incluída nas sessões de anilhagem científica que o Município do Porto abre ao público ao longo do ano.
Para o vice-presidente, estes “são sempre momentos muito especiais, quer seja pela proximidade com estas espécies, mas também no momento de as libertar novamente”. A que se alia a relevância de “as pessoas poderem ficar a conhecer melhor aqueles que são os habitantes da cidade, que temos que saber preservar”.
As datas das próximas sessões podem ser acompanhadas através da Ecoagenda.